quinta-feira, 15 de outubro de 2015

O Coro dos Otimistas-Acomodados


Nunca fui aquele tipo de pessoa que morre de amores pela arte de cozinhar, fazia uma sobremesa ou outra em alguma data especial, mas não era nada de mais. Há uns cinco anos eu estava em casa, toda iludida, achando que a vida adulta acontece de uma hora para a outra e então comecei a me interessar por algumas receitas específicas. A ideia era que logo eu precisaria morar sozinha e se não soubesse cozinhar pelo menos o básico iria morrer de fome dentro casa. Nessa pressa de começar a me preparar para a vida como uma adulta independente, adivinhem qual foi a primeira receita que eu quis aprender... Arroz? Feijão? Alguma carne que ficasse legal em uma travessa e me permitisse fazer bonito na frente das visitas? Não. A primeira coisa que quis aprender foi o pão de queijo! Acho que pela minha lista de prioridades alimentícias já é possível perceber o quanto estava preparada para morar sozinha.

Agora acabei de completar 22 anos, ainda moro com minha mãe e pra completar a lista de coisas que eu não imaginava que poderiam acontecer comigo, acabei de largar uma faculdade no sétimo período para começar tudo do zero em um novo curso. A vida, como sempre, saiu completamente do plano inicial, mas a receita do pão de queijo só foi aprimorada ao longo dos anos, então decidi prepara-la um dia desses. Coloquei no fogo a mistura de leite, óleo e sal, que usamos para escaldar o polvilho e em seguida (como sempre) meu sossego acabou. Assistia a um vídeo da Jout Jout, conferia se o leite tinha fervido. Dava uma olhadinha no twitter, conferia se o leite já tinha fervido. Me distraía um pouco mais com algum textão do facebook e quando me lembrava do fogo já saía correndo com medo de o fogão estar todo sujo. O leite ainda não tinha fervido.

“O leite só vai ferver quando você sair de perto.”

Essa foi a sábia frase que minha mãe disse enquanto via minha correria, e a verdade é que ela estava mesmo certa. O leite só ferveu quando eu saí de perto (felizmente eu consegui desligar a chama antes que ele inundasse o fogão). Mas o fato é o seguinte, vocês já perceberam quantas coisas na nossa vida imitam esse leite cheio de vontades? Se queremos muito um emprego, encontrar o amor da nossa vida ou só comprar aquela edição comemorativa do nosso livro preferido que está custando os olhos da cara, já vem aquele coro dos otimistas (ou seria o coro dos acomodados?) para dizer coisas do tipo “Fique calma, sua hora ainda vai chegar” ou então “Quando você menos esperar tudo vai acontecer”.

Sabe, talvez tudo isso seja verdade. Talvez o leite só ferva quando eu me esquecer que ele está no fogo, talvez o livro só entre em promoção quando eu tiver perdido as esperanças de compra-lo ou talvez o amor da minha só apareça quando eu parar de procurar tão desesperadamente por ele. Porque aqui entre nós, todo mundo sabe que ele não vai estar lá naquele aplicativo de paquera que só serve para ocupar a memória interna do celular. Mas eu quero ter o direito de não me contentar com esse “talvez”, porque talvez o que esteja realmente me cansando seja essa pressão toda para cantar junto com o coro dos otimistas-acomodados.

Pode ser que isso não seja o mais saudável, mas eu prefiro mesmo é me descabelar, me preocupar, achar que o mundo vai acabar se aquilo não der certo naquele momento e no outro dia perceber que nem era preciso fazer tanto drama assim. Quero ter a liberdade de vigiar o leite de cinco em minutos e de ficar imaginando que cada match pode ser a minha metade da laranja. É que eu prefiro ser a louca que sofre por antecipação do que ser aquela pessoa que fica sentada no sofá usando o destino para justificar a preguiça de se esforçar para ver seus desejos se realizarem. Ou talvez o que eu queira mesmo é... Quer saber, deixa pra lá, já tem “talvez” demais nesse texto.


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